O risco do obscurantismo na segurança pública
Por Ricardo Moura*
O que fazer quando os números não lhe são favoráveis? Se você é governador de São Paulo, a solução pode ser simplesmente ignorá-los em nome de uma subjetiva sensação de segurança. Isso foi o que fez Tarcísio de Freitas (Republicanos), ontem (29), ao tratar a situação da violência e da criminalidade no Centro da capital paulista.
Nas regiões da Sé e dos Campos Elísios, os roubos bateram recorde no primeiro semestre. “Não adianta nada você ter o indicador [positivo] e o cidadão não se sentir seguro, ficar falando de número não vai resolver o problema”, disse o governador.
A percepção da segurança é um fator complexo que, não necessariamente, está vinculado às estatísticas criminais. Passar por um trecho estigmatizado da cidade pode causar apreensão, ainda que nesse determinado local os índices sejam baixos. Os casos de subnotificação também ajudam a mascarar ocorrências, pois nem todo crime cometido é registrado oficialmente.
No entanto, quando um gestor diminui a importância dos números oficiais, um precedente perigoso é aberto. Sem indicadores e sem metas, não é possível fazer gestão. Como alocar recursos e efetivo, bem como cobrar resultados dos responsáveis se não há parâmetros para tal? Trata-se de uma governança freestyle calcada somente na ótica de quem estiver à frente do cargo naquele momento.
Além disso, a suposta sensação de segurança do cidadão paulista soa mais como uma falácia. Como pode o governador saber os pensamentos da população sem recorrer, mais uma vez, a instrumentos de coleta de pesquisa?
Ao pronunciar-se em tom de questionamento, o recado passado é de não confiança nas pesquisas e levantamento, ou seja, a ideia é que tudo recaia no obscurantismo para evitar críticas e cobranças.
Por fim, Tarcísio de Freitas retoma o discurso de “guerra às drogas” apontando o crescimento no número de apreensões, tanto na capital quanto no interior. Como se isso resolvesse algum tipo de problema na esfera da criminalidade e no mercado ilegal de entorpecentes. É a política do mais do mesmo, da roda do hamster que nunca para de correr sem sair do canto e esgota suas energias em um ato contínuo e infrutífero.
O comentário do governador de São Paulo, infelizmente, não é um clamor solitário no deserto. Os governantes costumam atacar o mensageiro quando as notícias não são boas. Esse ceticismo independente de ideologia política. É preciso que a sociedade esteja atenta para que a transparência de dados seja mantida. Sem esse radar, a avaliação sobre os gestores se torna míope. Colocar em dúvida as estatísticas não é um ato impensado, mas um projeto de poder bastante perigoso.
Ricardo Moura é consultor para o Nordeste na Rede de Observatórios.*