Aumento dos registros de nome social aponta novos rumos para uma democracia inclusiva
*Por Wellerson Soares
As eleições de 2022 ainda não definiram seus representantes para os cargos públicos nos próximos quatro anos, mas será marcada pela representatividade de pessoas transgênero, transexuais e travestis indo às urnas com o nome pelo qual preferem ser chamadas. Este ano, 37.646 brasileiros terão o nome social registrado em seus títulos de eleitor e no caderno de votação, número quatro vezes maior em relação a 2018, que registrou 7.945 eleitores segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O crescimento pode ser explicado pela portaria de 2018 do TSE, que considerou a autodeclaração suficiente para a emissão do documento, não sendo necessário apresentar outra documentação oficial com o nome retificado, tampouco a comprovação de cirurgia de adequação de gênero. Além disso, a campanha de incentivo da juventude a ir às urnas, sobretudo nas redes sociais, também contribuiu para a estatística. Não por acaso jovens com até 24 anos representam 58% do eleitorado com nome social.
Vicente Pedreira, de 23 anos, é uma das pessoas que irá exercer o direito este ano. Será a primeira vez com o nome que se identifica, já que em 2018 ainda não havia iniciado o processo de transição. Por isso, o reconhecimento em um momento democrático significativo é bastante celebrado.
“A sensação é de alívio por não precisar me justificar mostrando a documentação, como sempre, e ver as pessoas expressando descontentamento inconscientemente (por vezes conscientemente) até pelo olhar. Comecei o processo de transição em 2020, depois de anos alimentando uma obediência de gênero, mas esse ano será com um avanço no quesito dignidade para pessoas trans”, disse Vicente em entrevista à Rede de Observatórios.
O aumento também foi registrado entre os candidatos. Segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), foram mapeadas pelo menos 79 candidaturas trans pelo Brasil, um crescimento de 49% em relação a 2018, com 53 registros. São 70 travestis e mulheres trans, 5 homens trans, e 4 com identidades não binárias.
A presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais, Keila Simpson, fala sobre a importância do momento para que a população trans tenha representatividade em cargos políticos e no cotidiano.
“Esse aumento [do número de registros] se dá por conta da conjuntura, porque desde 2016 temos investido bastante nas possibilidades que a população trans também tem, e ela deve sim disputar o espaço político-partidário. O acesso ao nome social faz com que essas pessoas se sintam representadas e sejam de fato quem são, diferentemente de anos atrás quando era difícil concorrer e colocar a cara com aparência feminina ou masculina e com nome que não correspondia ao da identidade. As conquistas vão chegando e a gente tem visto essa possibilidade”, disse Keila.
O pequeno avanço nos direitos, no entanto, ainda é ínfimo. As dificuldades se apresentam constantemente, seja pelo preconceito no dia a dia ou pelas implicações jurídicas que dificultam a retificação do registro civil. Isso explica o motivo de apenas 0,02% do eleitorado apto para votar em 2022 ser formado por pessoas com nome social, segundo dados do TSE.
Para a eleição deste ano não há mais a possibilidade de atualização para o nome social. Mas a solicitação de mudança pode ser feita pelo site Título Net. O solicitante preenche o requerimento com a documentação necessária e envia à zona eleitoral respectiva. O passo a passo está disponível no canal do TSE no Youtube.
* Wellerson Soares é jornalista na Rede de Observatórios da Segurança