Rede de Observatórios de Segurança

Na Grande Niterói, onde ocorreu a chacina do Salgueiro, quase metade das mortes violentas são causadas por policiais

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event 2 de dezembro de 2021
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Silvia Ramos*

O ano de 2021 ficará marcado pelos dois massacres que tiveram muito impacto tanto pelos números como pelos métodos policiais. Em maio foram 27 mortos no Jacarezinho. Em novembro, os 9 mortos no Salgueiro, em São Gonçalo. Mas a despeito dos números escabrosos desses dois eventos, não podemos nos esquecer nem um minuto que foram – apenas até outubro – 1215 mortes decorrentes de ação policial no estado do Rio de Janeiro. Ou seja, as mortes no varejo da ação policial, no dia a dia predominam: são um, dois, três mortos em uma comunidade aqui, outra ali, e quando somamos esses assassinatos, temos 4 mortes por dia, em média.  E o ano não acabou. Vamos ultrapassar as mortes pela polícia do ano passado. O Rio consegue se superar quando se trata de violência policial. 

O Brasil é conhecido por suas polícias violentas, com mais de 6.000 mortes contabilizadas a cada ano, fora as mortes que as polícias de vários estados não declaram. Mas o Rio ainda assim é um ponto fora da curva do próprio Brasil. A taxa média de mortes pela polícia no Brasil é de 3,0 por cem mil habitantes e a do RJ é de 7,2. A taxa de São Paulo é 1,8, a de Minas Gerais 0,6. Isso prova que mesmo para um país com o padrão do Brasil, é possível fazer polícia com letalidade menor do que a praticada pelas polícias fluminenses. 

Os números mais chocantes se mostram quando nos aproximamos do que acontece em São Gonçalo e região há anos. Essa é a área do 7º. BPM, isto é, a 7ª. AISP, a área integrada de segurança pública onde a polícia manteve a maior letalidade e a violência policial escalou em 2021. No estado do Rio a polícia é responsável por 30% das mortes violentas e na região da Grande Niterói essa proporção atinge 47,6%. Isto é, quase a metade de todas as mortes violentas na região são praticadas pelas polícias.  

O 7º. BPM tem triste memória. Em 2011 a juíza Patrícia Acioli foi assassinada na porta de casa depois de ter condenado policiais do batalhão de São Gonçalo. Em seguida ao seu assassinato, foi revelado um esquema de policiais corruptos e milicianos dentro da unidade, comandados pelo próprio comandante, Cel Cláudio, que foi condenado em preso. Em 2017, uma megaoperação buscou 96 PMs denunciados por corrupção, sendo que 49 deles participavam de num esquema de corrupção de policiais dentro do batalhão de São Gonçalo. Todos esperavam que a PMERJ fosse fazer uma grande mudança no BPM, com mudança de comandante e transferência de praças. Nada disso ocorreu e o 7º. BPM continuou com sua triste trajetória de violência e corrupção.    

Em maio de 2021, o menino João Pedro foi morto numa operação inexplicável combinada entre a polícia civil e a polícia federal. Essa ação motivou a medida cautelar do ministro do STF que restringiu operações policiais durante a pandemia, o que fez com que as mortes por ação policiais no estado caíssem 70% em junho daquele ano. De novo, nenhuma mudança estrutural ocorreu em São Gonçalo 

E, dessa forma, chegamos ao mês de outubro com o 7º. BPM sendo o campeão das mortes violentas no RJ, com 184 autos de resistência. São Gonçalo também tem os piores indicadores de letalidade violenta, roubos de rua e roubos de veículo. A operação vingança de novembro que, deixou 9 mortos num mangue, não surpreende numa região em que corrupção e violência policial se combinam há anos, produzindo os maiores indicadores de letalidade no estado mais letal do país em termos de violência policial.

O que o comando da PMERJ e o governador Claudio Castro estão esperando para fazer uma mudança radical no 7º. BPM? Um outro João Pedro?  

* Silvia Ramos é coordenadora da Rede de Observatórios da Segurança

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