Rede de Observatórios de Segurança

Eu não sou o índio da Xuxa

event 19 de abril de 2023

Carta aberta de Fabrício Titiah, liderança indígena do povo Pataxó Hãhãhãi.

O povo Pataxó Hãhãhãi  é diferente de Pataxó. Somos vizinhos, mas cada um com sua história e cultura próprias. Estamos localizados no Sul da Bahia, entre os municípios de Pau Brasil, Camacã e Itaju do Colônia. O território é um agrupamento de etnias, o que chamamos de famílias étnicas. Temos os que são originários da terra e os que foram agregados ao local, vítimas de massacres. 

No período dedicado à visibilidade da luta dos povos originários no Brasil, estamos passando por um momento muito difícil, estou muito triste. Perdemos mais uma vida, fruto de uma invasão ao nosso território. O que era para ser um momento de ter um olhar sensível às nossas causas virou de tristeza. Os indígenas não têm um minuto de descanso, somos violentados a todo momento. E o jovem Daniel Souza dos Santos, de 17 anos, foi covardemente assassinado.

O que eu quero que o Brasil entenda sobre os povos indígenas, na minha visão enquanto jovem Pataxó Hãhãhãi, é que nossa luta é a de um coletivo pela vida no planeta, pela garantia da vida, da preservação da biodiversidade, que já é cientificamente provado. Mas muitas vezes o protagonismo da luta do nosso povo na garantia de segurança é ignorado.

Queremos que entendam que nosso olhar sobre a terra não é voltado para o capital, nem monetário, mas de equilíbrio e de viver em harmonia com a natureza de forma respeitosa. 

Desejamos um olhar compreensivo à nossa causa e que se somem a ela. Hoje vejo que um dos principais problemas é o não entendimento e por isso são veiculadas muitas notícias falsas e tendenciosas. Esse processo também deve ser educativo e começar nas escolas. Há uma visão totalmente errada do que é o indígena no Brasil. É o índio da dança da Xuxa, é o que faz adereços de borracha. Uma percepção totalmente equivocada, estereotipando os povos que têm uma grande diversidade de cultura, fenótipos, cada etnia tem seus traços. 

Meu desejo é que as pessoas entendam de uma vez por todas que nossa luta é para preservar o planeta e principalmente a terra e o território. Por meio dos nossos territórios conseguimos garantir todos os outros direitos. Se temos território demarcado, consequentemente temos educação, saúde de qualidade e segurança alimentar porque produzimos alimentação.

Uma vez que nosso direito à terra é negado e a demarcação não é feita, ficamos em uma situação de vulnerabilidade grande, tanto de conflito com invasores quanto de assédio de mineradoras, de serralherias e do tráfico de drogas. O território Pataxó Hãhãhãi foi demarcado em 2012 e ainda assim somos vítimas de invasão e assassinato. 

Por isso, pedimos o entendimento do nosso direito ao território. Garantindo a qualidade de vida dos povos indígenas garantimos também qualidade de vida ao planeta inteiro.

Sobre Fabrício Titiah

É presidente da Associação Hã Hã Hãe Indígena de Água Vermelha (AHIAV), estudante de Biologia da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc) e comunicador nas redes sociais, desenvolvendo um trabalho voltado à desconstruir pensamentos criados acerca dos povos indígenas e sua história.  

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