Nem governadora está livre do racismo no Piauí
Por Marcondes Brito da Costa* e Maria D’Alva Macedo Ferreira**
“Ódio exige a existência, e aquele que odeia tem que mostrar seu ódio em ações e comportamentos apropriados; De certa forma, ele tem que se tornar ódio.” Frantz Fanon
Após aprovar o Dia dos Sacerdotes de Religiões de Matriz Africana, a governadora do Piauí Regina Sousa foi vítima de racismo de cunho religioso no grupo da OAB-PI. O advogado Ralisson Amorim Santiago compartilhou o link de uma matéria junto ao comentário “Tia da macumba” no último dia 4 de julho. O episódio no grupo formado por mais de 250 advogados – alguns deles ocupando cargos na diretoria e também no conselho seccional da OAB-PI e, ainda, no conselho federal do órgão – prova que nem mesmo a detentora do mais alto cargo administrativo de estado escapou de ser vítima de racismo. A Rede obteve, de fonte anônima, prints de conversas:
Essa fala carregada de preconceito e violência, denota pelo menos duas nuances do racismo à brasileira:
1- A inferiorização das pessoas a quem ele se destina às colocando em cargos compreendidos por quem o pronuncia como inferiores – nesse caso específico a “tia“.
2 – No Brasil, uma das manifestações mais intensas do racismo, recai sobre qualquer atividade realizada por negros, nesse caso especifico, as religiões de matrizes africanas, e pessoas que nela militam ou dela vivem – que por sua vez são violentados fisicamente ou simbolicamente, chamados pejorativamente de macumbeiros, como o autor da ofensa fez.
A governadora do Piauí ousou romper várias barreiras: ser mulher, negra, de classe pobre, que consegue chegar ao poder. Isso parece soar para muitos que se nutrem e apregoam o ódio mascarado pelo racismo como afronta. Uma mulher negra no poder não é aceita por aqueles que fazem parte da política tradicional com sobrenomes dominantes na história do estado. Aqui predomina também o machismo.
O caso não é isolado. Regina Sousa é vítima recorrente de racismo religioso nos últimos anos. Em 2016, então senadora durante o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, foi alvo de comentário racista do apresentador Danilo Gentilli. Outro episódio aconteceu em abril deste ano. Há menos de 24h no maior cargo de autoridade do Piauí, ela foi novamente vítima de racismo religioso por parte do Prefeito de Parnaíba, Mão Santa.
O profissional do direito/advogado que, em grupo de advogados e advogadas, se sente empoderado para ofender a maior autoridade do estado, nos mostra da pior forma possível que o racismo extrapola as relações de poder. A governadora foi vítima pela sua raça e por entender que numa democracia todos os grupos religiosos devem ser valorizados.
Tanto o racismo como a intolerância religiosa são crimes previstos no código penal brasileiro. Mas isso não desencoraja o advogado que ainda conta com a proteção dos panos quentes dos companheiros da ordem. Antes de ser repreendido por outros colegas seu comentário gerou risadas. Quem riu e quem se calou é tão racista quanto Ralisson Amorim Santiago.
* Sociologo-UFPI. Mestre em Políticas Públicas-UFPI. Doutor em Sociologia -UFPI. Professor e pesquisador . Coordenador da rede de Observatórios da Segurança Pública-PI
**Doutora em Serviço Social- Coordenadora da Rede de Observatórios da Segurança Pública-PI