Método de tortura “quebra dedos” se dissemina por estados
Por Ricardo Moura*
Em reportagem recente, a Folha de S. Paulo mostrou que detentos do sistema prisional cearense são submetidos a torturas e maus tratos diversos que podem ser representados pela figura do “quebra dedos”. Cada vez mais comum, na prática a mão do preso é lesionada a golpes de cassetetes durante os procedimentos realizados por policiais penais.
Embora a denúncia tenha ganhado espaço na mídia nacional no mês passado, esse tipo de tortura já havia sido denunciado no começo de 2019 pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura após visita aos presídios cearenses. Novos casos foram divulgados pela série de reportagem esta semana, como o de presos que têm seus testículos torcidos e são pendurados de cabeça para baixo em “posição de taturana”.
Também por causa de denúncias de tortura e maus tratos, na semana passada, a Corregedoria-Geral de Presídios determinou o afastamento, por 90 dias, de toda a diretoria da Unidade Prisional Agente Elias Alves da Silva (UP-IV), em Itaitinga, Região Metropolitana de Fortaleza. A extensão de tais casos levanta a questão sobre o grau de anuência dos gestores em relação a esse tipo de prática.
A Folha revelou ainda que a tortura do “quebra dedos” não ocorre apenas no Ceará, mas também em quatro outros estados: Amazonas, Pará, Rio Grande do Norte e Roraima. Não por acaso, todos são áreas de atuação da Força Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP), unidade criada por Mauro Albuquerque, atual titular da Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização do Estado do Ceará (SAP). De tão comum e de tão aceita, poderíamos considerar a utilização da tortura como uma política prisional não-escrita que funcionaria em paralelo às normas previstas pela Lei de Execução Penal (LEP).
A Associação dos Defensores Públicos do Estado do Ceará (ADPEC) publicou uma nota de repúdio em que critica a existência de casos de tortura no sistema prisional. De acordo com a entidade, “a tortura é uma prática, até certo ponto, invisível para a sociedade, mencionada como o crime dos três ‘Is’: Invisível, Ininvestigável e Impunível. É comum as denúncias de tortura nos presídios serem recebidas com descrença, sobretudo devido à assimetria entre vítima (preso) e o torturador (agente de segurança do Estado)”.
Após a repercussão na mídia, o governador do Estado do Ceará, Elmano de Freitas (PT), se reuniu com o presidente do Tribunal de Justiça do Ceará, a Procuradoria Geral do Estado e a SAP para discutir estratégias que resolvam os casos de agressão no interior das penitenciárias. Com esse objetivo, foi criado um fórum de análise e acompanhamento do sistema penitenciário cearense que se reunirá periodicamente. Resta saber quais serão os resultados concretos de toda essa movimentação.
Ricardo Moura é consultor para o Nordeste na Rede de Observatórios.*